quinta-feira, 10 de setembro de 2009

A Tristeza

“Porque a tristeza, segundo Deus, opera arrependimento para a salvação, o qual não traz pesar; mas a tristeza do mundo gera a morte.”
— Paulo. (2ª EPÍSTOLA AOS CORÍNTIOS, capítulo 7, versículo 10.)


O homem chegou em casa, naquela noite, trazendo o mau humor que o caracterizava há alguns meses. Afinal, eram tantos os problemas e as dificuldades, que ele se transformara em um ser amargo, triste, mal humorado. Colocou a mão na maçaneta da porta e a abriu. A luz acesa na cozinha iluminava fracamente a sala que ele adentrou. Deteve o passo e pôde ouvir a voz do filho de seus quatro anos de idade:
- Mamãe, por que papai está sempre triste?
Não sei, amor, respondeu a mãe, com paciência. Ele deve estar preocupado com seus negócios.
O homem parou, sem coragem de entrar e continuou ouvindo:
- Que são negócios, mamãe?
- São as lutas da vida, filho.
Houve uma pequena pausa e depois, a voz infantil se fez ouvir outra vez:
- Papai fica alegre nos negócios?
- Fica, sim, respondeu a mãe
- Mas, então, por que fica triste em casa?
Sensibilizado, o pai de família pôde ouvir a esposa explicar ao pequenino:
- Nas lutas de cada dia, meu filho, seu pai deve sempre demonstrar contentamento. Deve ser alegre para agradar o chefe da repartição e os clientes. É importante para o trabalho dele. Mas, quando ele volta para casa, ele traz muitas preocupações. Se fora de casa, precisa cuidar para não ferir os outros, e mostrar alegria, gentileza, não acontece o mesmo em casa.
- Aqui é o lar, meu filho, onde ele está com o direito de não esconder o seu cansaço, as suas preocupações.
A criança pareceu escutar atenta e depois, suspirando, como se tivesse pensado por longo tempo, desabafou:
- Que pena, hein, mãe? Eu gostaria tanto de ter um pai feliz, ao menos de vez em quando. Gostaria que ele chegasse em casa e me pegasse no colo, brincasse comigo. Sorrisse para mim. Eu gostaria tanto...
Naquele momento, o homem pareceu sentir as pernas bambearem. Um líquido estranho lhe escorreu dos olhos e ele se descobriu chorando.
Meu Deus, pensou. Como estou maltratando minha família.
E, ainda emocionado, irrompeu pela cozinha, abriu os braços, correu para o menino, abraçou-o com força e lhe convidou:
- Filho, vamos brincar?
-.-.-.-
Há tempos a sombra da tristeza vem abatendo  muitos corações, trazendo pesar e angustias... familias que não dialogam, trabalhadores infelizes com suas ocupações, pessoas que vêem a vida em tons cinzas e pretos... apesar de todos os recursos e facilidades a disposição do ser humano, o encontramos muitas vezes melancólico e desesperançado quanto a vida e seu futuro.
É certo que todos somos humanos, temos nossos momentos de dificuldade e muito natural que tenhamos momentos de tristeza. Inclusive médicos, psicólogos e psicanalistas do mundo todo começam a levantar uma bandeira que pode parecer estranha: a de que a tristeza não deve ser evitada a qualquer custo, pois faz parte do nosso cotidiano e até nos ajuda a crescer. “Há um sentido existencial nesse sentimento, pois ele nos faz questionar a nossa vida e buscar caminhos alternativos”, defende o psicólogo Fabiano Murgia, de São Paulo, em entrevista a revista Saúde é Vital e também autor do livro Salve a Depressão (Editora Edicta). Ele acredita que os quadros depressivos geralmente são criados por emoções mal resolvidas. Essa tristeza podemos considerar ser a “tristeza segundo Deus”, nas palavras de Paulo de Tarso. É como um “cair” em si, nos fazendo despertar para nosso intimo, para nossos sentimentos e como estamos conduzindo nossa vida. Quando nos percebemos numa encruzilhada e decidimos que temos de mudar nossos hábitos e forma como enxergamos o mundo. Libertamos-nos do pesar e das culpas, do orgulho e da vaidade e decidirmos dar valor ao que realmente importa em nosso caminho. Em geral o homem de hoje, nas sábias palavras de Dalai Lama, perde a saúde para ganhar dinheiro e depois gasta todo dinheiro para recuperar a saúde, vive como se não fosse morrer e morre como se não tivesse vivido. Inevitavelmente acaba se angustiando por não encontrar a felicidade no materialismo da sociedade. A angustia deve ser encarada como o “termômetro” da alma... quando temos febre, não é ela em si o problema. Nosso organismo está indicando que há algo errado com ele. Quando estamos angustiados é um sinal da alma, nos avisando que algo em nosso mundo intimo necessita ser modificado.

Mas há também uma segunda tristeza, a “tristeza do mundo”, que vem atormentando a muitos de nós... quando saímos daqueles  momentos de tristeza para uma vida de tristeza, aflição, reclamações e queixas sem parar contra Deus e o mundo, revivendo com insistência quadros tristes vividos no passado, pessimismo e a tão famosa melancolia (falta de prazer nas atividades diárias, desânimo sem uma causa real, como a morte de um ente querido, por exemplo), que é considerada uma das características da depressão. Já no século V a.C., Hipócrates, considerado Pai da Medicina, classificou a melancolia como doença. Segundo a Organização Mundial da Saúde, a doença atinge cerca de 121 milhões de pessoas no planeta. Desse total, apenas 25% recebem tratamento adequado. Em O Evangelho Segundo o Espiritismo, Capitulo V, o espírito François de Genéve, nos questiona: Sabeis por que uma vaga tristeza se apodera por vezes de vossos corações, e vos faz sentir a vida tão amarga? E assevera: É o vosso Espírito que aspira à felicidade e à liberdade, mas, ligado ao corpo que lhe serve de prisão, se cansa em vãos esforços para escapar. E, vendo que esses esforços são inúteis, cai no desânimo, fazendo o corpo sofrer sua influência, com a languidez, o abatimento e uma espécie de apatia, que de vós se apoderam, tornando-vos infelizes.

É nosso descaso da nossa realidade de espíritos imortais, destinados a construir a própria felicidade através de seu trabalho não só material, mas também espiritual, que nos faz entrar em desespero, nos revoltar e nos entregarmos a desesperança diante dos problemas da vida. Se vivêssemos na plena certeza de que cada dificuldade é um degrau a mais, que serve para nos alavancar no progresso espiritual, não haveriam obstáculos que não superassemos. Essa tristeza segundo o mundo realmente nos conduz a morte... a morte da alegria, da paz, da felicidade, que em muitos casos levam pessoas a fuga da própria vida, através do suicidio! Por isso nos pede François : Acreditai no que vos digo e resisti com energia a essas impressões que vos enfraquecem a vontade. Essas aspirações de uma vida melhor são inatas no Espírito de todos os homens, mas não a busqueis neste mundo(...)Pensai que tendes a cumprir, durante vossa prova na Terra, uma missão de que já não podeis duvidar, seja pelo devotamento à família, seja no cumprimento dos diversos deveres que Deus vos confiou. Por isso devemos estar atentos diante das lutas que surgem em nossa estrada, sejam no trabalho, sejam no ceio da família. É a missão que nos cabe realizar para nossa verdadeira felicidade. A lutas diarias se compõe de mil vicisitudes que acabam por nos ferir. Mas jamais nos entregarmos logo no primeiro “round” . Devemos persistir e crer que a vida deve e pode ser melhor, seguindo o conselho de Paulo em sua epistola aos Tessalonicenses 5:8, “tende por capacete a esperança na salvação”!!
Protejamos nossa mente do desânimo, com o constante otimismo, a perseverança de quem sabe possuir em si a força, a coragem, a luz que Jesus asseverou que devêssemos fazer brilhar e não colocá-la escondida sob o alqueire de nossos medos e inseguranças. Não tenhamos medo de encarar as sombras que muitas vezes acalentamos em nosso intimo, pelo contrario, façamos luz sobre elas a fim de que sejam dissipadas. Vamos assumir nossa grande missão de sermos felizes e fazermos felizes os que estejam a nossa volta. Sejamos alegres e façamos os outros alegres. Se surgir a tristeza natural, que faz parte da nossa jornada, mas não deixemos que ela governe nossa vida, que ela sirva de instrumento de renovação. Sejamos artistas que pintam o quadro da vida em tons multicolores. Trabalhemos pela nossa segurança intima. Como diz um velho provérbio hindu, “o coração que está em paz vê uma festa em todas as aldeias”. Grande abraço a todos!!

Diogo Caceres

terça-feira, 1 de setembro de 2009

TEMPO DE CONFIANÇA



Todos já vivemos tempos de turbulência em nossas vidas. Momentos de dor, de dificuldades que se assemelham a terrível tempestade que ameaçam virar o barco de nossa vida... surgem essas tempestades de diversas formas: uma doença, um conflito com o parente difícil, problemas no trabalho, a partida de um ente querido, a desilusão que vem de forma inesperada, etc. Situações que muitas vezes parecem espremer o coração.

Há séculos atrás o Divino Amigo Jesus, como relatado em Marcos, 4:35-41, nos passa significativa lição sobre o assunto. Após um dia a consolar e envolver as multidões em suas palavras e vibrações de amor, disse aos discípulos que deveriam atravessar o mar da Galiléia, também conhecido como lago de Genesaré. Adentrando ao barco Jesus se recosta a popa do barco e começa a dormir. Em meio a viagem, o céu antes azul e sem nuvens, dá lugar a terrível temporal, nuvens escuras, raios faíscam, ondas sobem por cima do barco... assustados os discípulos correm a acordar o Mestre Amigo: socorre-nos que perecemos, afirmam!!
Jesus levanta-se, repreende o vento e diz ao mar: Cala-te, aquieta-te. E o vento se aquietou, e houve grande bonança. E disse-lhes: Por que sois tão tímidos? Ainda não tendes fé? E sentiram um grande temor, e diziam uns aos outros: Mas quem é este, que até o vento e o mar lhe obedecem? Cena memorável, que mexe com nossos pensamentos e sentimentos e nos leva também a nos questionar: onde está a nossa fé?
Em O Evangelho Segundo o Espiritismo, Capitulo 19, em Instrução dos Espíritos, um Espírito Protetor afirma: A fé é o sentimento inato, no homem, da sua destinação. É a consciência das prodigiosas faculdades que traz em germe no íntimo, a princípio em estado latente, mas que ele deve fazer germinar e crescer, através da sua vontade ativa. Nos dias atuais vemos a realidade dessas faculdades prodigiosas, demonstrada pela própria ciência que confirma os benefícios da fé no controle de uso de drogas e de álcool; influência na não participação em crimes; ainda, diversos estudos descobriram que altos níveis de comprometimento religioso resultam em níveis mais baixos de depressão e estresse, e também na estabilidade familiar, recuperações de enfermidades graves, seja pela convicção própria como também pela intervenção de terceiros, através da prece. O Espírito Protetor ainda assevera: A fé é humana ou divina, segundo a aplicação que o homem der às suas faculdades, em relação às necessidades terrenas ou às suas aspirações celestes e futuras. O homem de gênio, que persegue a realização de um grande empreendimento, triunfa se tem fé, porque sente em si mesmo que pode e deve triunfar, e essa certeza íntima lhe dá uma extraordinária força. O homem de bem que, crendo no seu futuro celeste, quer preencher a sua vida com nobres e belas ações, tira da sua fé, da certeza da felicidade que o espera, a força necessária, e ainda nesse caso se realizam os milagres da caridade, do sacrifício e da abnegação. Por fim, não há más inclinações que, com a fé, não possam ser vencidas.

Cientes disso, pegamo-nos a refletirmos: dizemos muitas vezes que somos pessoas de fé, que confiamos, que fazemos e desfazemos, mas diante do primeiro obstáculo desanimamos, desistimos e acreditamos que não será possível continuar. Quantas vezes nos apegamos a superstições como solução de nossos temores ou problemas? Conhecia um colega que não saia de casa sem um pé de coelho de casa, senão dava “má sorte”... o curioso é que o pé não havia dado sorte ao coelho. O mesmo se dá com os signos, os jogos de cartomancia, etc. Isso ocorre porque muitas vezes nós possuímos uma fé sem bases, dizemos que acreditamos, mas não sabemos por que acreditamos em algo. Nesse sentido, a fé pode ser racionada ou cega. A fé cega nada examina, aceitando sem controle o falso e o verdadeiro, e a cada passo se choca com a evidência da razão. Levada ao excesso, produz o fanatismo. Quando a fé se firma no erro, cedo ou tarde desmorona. Por isso inevitável afirmarmos com Allan Kardec, codificador da doutrina Espírita: "só é inabalável a fé que pode enfrentar a razão face a face, em todas as épocas da Humanidade".

Em verdade só descobrimos a fé inabalável diante dos embates do caminho... a fé é testada diante das inúmeras provações, que mais não fazem do que burilar nosso intimo, fazendo despertar as faculdades prodigiosas que todos possuímos... inúmeros dos milagres de toda a historia humana se explicam por essa capacidade divina em nós, que nada mais é que resultado de uma lei natural, apenas desconhecida do homem, como também era desconhecida a eletricidade, o magnetismo, a força da gravidade. Somos como o minério bruto que retirado da natureza é lapidado até se transformar num brilhante diamante!! Mas para que possamos superar os golpes do “ourives” que é a vida, precisamos acreditar em nosso potencial, compreendermos que há uma Inteligência Superior, que deixa sua assinatura na natureza em nossa volta. Que nos criou para a felicidade, que é construída diariamente a cada superação, a cada vitória, por mais pequenina que seja. Sejamos então otimistas, mesmo diante das maiores dificuldades, por que essa é a verdadeira lógica. Como disse Helen Keller, escritora, conferencista e ativista social estadunidense ( que ficou cega e surda, desde tenra idade, um dos maiores exemplos de que as deficiências sensoriais não são obstáculos para se obter sucesso), “o otimismo é a fé em ação. Nada se pode levar a efeito sem otimismo”.

O que não nos faltam são exemplos da importância dessa fé em ação e de como sua ausência pode nos atravancar o caminho. A primeira mulher a atravessar a nado o Canal da Mancha foi uma jovem de vinte anos de idade. Seu nome era Gertrude Ederle e esse fato se deu no dia 6 de agosto de 1926. Depois dela, uma outra mulher, de trinta e quatro anos, Florence Chadwick, tornou-se a primeira mulher a atravessar o Canal da Mancha, nos dois sentidos. Mas, em 1952, essa mesma mulher decidiu atravessar a nado os 33 km entre a Ilha de Catalina e Long Beach, na Califórnia. O dia 4 de julho, escolhido para a proeza, não estava propício. A manhã estava muito fria e havia um nevoeiro intenso. Ela se preparou e mergulhou na água. Contudo, mal conseguia ver os barcos que a acompanhavam. O nevoeiro era denso. O frio e o cansaço não conseguiam fazê-la desistir. Ela podia ouvir as vozes de incentivo do treinador. Contudo, as forças a foram abandonando. Ela continuou nadando. Era a sua determinação a lhe ordenar que prosseguisse. Mas, um pouco antes de chegar à praia, ela pediu para ser recolhida a bordo. De nada valeram as rogativas de sua mãe e de seu treinador.
-Não posso mais! Não agüento mais! Dizia ela. Minutos depois ela descobriu que restavam apenas oitocentos metros para chegar à praia. Ante a desolação dos que lhe seguiam os esforços de perto, incentivando-a, falou: "não estou dando desculpas, mas se eu tivesse conseguido ver a praia, poderia ter chegado até lá." Florence Chadwinck foi vencida não pelo frio, nem pelo cansaço. Foi derrotada pelo nevoeiro. Com os homens, ocorre de forma semelhante. O nevoeiro da incredulidade interfere em muitos caminhos,  nos entregando à desesperança, desistindo as vezes muito perto de alcançarmos a vitória.
Que, portanto, possamos construir em nosso dia-a-dia a fé que nos permita a serenidade diante das lutas, a coragem que nos impulsiona a superação, o otimismo que jamais nos deixe cair no poço escuro do pessimismo, o amor que nos auxilie a compreender a todos a nosso volta. Hora de assumirmos o leme do barco da vida, não nos desesperando mais diante das tempestades que surgirem no percurso. Não estamos sós, há sim uma Providencia a nos amparar em todos os momentos. É chegado o tempo da confiança, que nos permita enxergar o destino a que nos propomos chegar, com perseverança e muito alegria. Abraço a todos!

Diogo Caceres